Este artigo foi totalmente baseado no texto: O vídeo na sala de aula, de MORAN, José Manuel.
A televisão, o cinema e o vídeo, os meios de comunicação audiovisuais, exercem, de forma indireta, um papel educacional proeminente. Passam-nos ininterruptamente informações, interpretadas; mostram-nos modelos de comportamento, ensinam-nos linguagens coloquiais e multimídia e privilegiam alguns valores em detrimento de outros.
O conteúdo oferecido pelos programas televisivos passou a orientar as nossas vidas. Pessoas de todas as idades, condições econômicas e níveis intelectuais começaram a viver "ligados na televisão". Determinadas pessoas chegaram "no limite": trocaram de lado. Adotar em suas vidas valores, hábitos e comportamentos reproduzidos dos personagens da televisão. Transformaram também "personagens". Não conseguem mais viver distante da televisão e assimilam acriticamente tudo o que é nela veiculado.
Na busca desesperada pela audiência imediata, constante e universal, os meios de comunicação hiper-exploram nossas emoções, fantasias, desejos, medos e aperfeiçoam ininterruptamente estratégias e fórmulas de sedução e dependência. Passam com inexplicável facilidade do real para o imaginário, aproximando-os em fórmulas integradoras, como nas telenovelas e nos reality-shows como o Big-Brother e semelhantes.
A mídia televisiva como tecnologia de comunicação e informação invade o cotidiano e passa a fazer parte dele. Não é mais vista como tecnologia, mas como complemento, como companhia, como continuação do espaço de vida das pessoas. Por meio do que é transmitido pela televisão, as pessoas adquirem informações e transformam seus comportamentos. Tornam-se "tele dependentes", consumidores ativos, permanentes e acríticos de tudo o que é oferecido pelo universo televisivo.
Este é um dos ascendentes desafios para a ação das Instituições de Ensino diante do que é veiculado pela televisão na contemporaneidade. Viabilizar-se como espaço crítico em relação às informações e manifestações veiculadas pela TV. Aos educadores é designada a importante empreita de refletir com os seus alunos sobre o que é apresentado pela televisão, suas posições e problemas. Reconhecer a sua influência no modo de ser e de agir das pessoas e na própria maneira de se comportar diante do seu grupo social, como cidadãos.
Apropriando-se das palavras de Umberto Eco (1997),
"Nós precisamos de uma forma nova de competência crítica, uma arte ainda desconhecida de seleção e decodificação da informação, em resumo uma sabedoria nova". É conciso saber aproveitar a liberdade e a criatividade do espaço televisivo, mas, ao mesmo tempo, aprender a determinar os limites, a consciência crítica, reabilitar os valores e fortalecer a identidade das pessoas e dos grupos. Desafios da atualidade a serem enfrentados por todos os educadores”.
A televisão e o vídeo partem do concreto, do visível, do imediato, próximo, que toca todos os sentidos. Mexem com o corpo, com a pele, as sensações e os sentimentos, estão ao nosso alcance através dos recortes visuais, do close, do som estéreo envolvente.
Isso nos dá sugestões para começar na sala de aula pelo sensorial, pelo afetivo, pelo que toca o aluno antes de discorrer de idéias, de conceitos, de teorias. Partir do concreto para o abstrato, do imediato para o mediato, da ação para a reflexão, da produção para a teorização.
A televisão, o vídeo e a Internet não são simplesmente tecnologias de apoio às aulas, são mídias, meios de comunicação. Podemos analisá-las, dominar suas linguagens e produzir, divulgar o que fazemos. Temos a possibilidade de incentivar que os alunos filmem, apresentem suas pesquisas em vídeo, em CD ou em páginas WEB (páginas na Internet). Em seguida, avaliar as produções dos alunos e partindo delas desenvolver a reflexão teórica.
A escola necessita analisar o que está sendo divulgado nos meios de comunicação e apontar isto na sala de aula, discutindo com os alunos, ajudando-os a que percebam os aspectos positivos e negativos das abordagens sobre cada assunto. Fazer leituras de alguns programas em cada área do conhecimento, partindo da visão que os acadêmicos possuem sobre o assunto, e ajudá-los a progredir de forma suave, sem imposições nem maniqueísmos[1].
Segundo o professor Moran[2]:
“O vídeo está umbilicalmente ligado à televisão e a um contexto de lazer, e entretenimento, que passa imperceptivelmente para a sala de aula. Vídeo, na cabeça dos alunos, significa descanso e não "aula", o que modifica a postura, as expectativas em relação ao seu uso. Precisamos aproveitar essa expectativa positiva para atrair o aluno para os assuntos do nosso planejamento pedagógico. Mas ao mesmo tempo, saber que necessitamos prestar atenção para estabelecer novas pontes entre o vídeo e as outras dinâmicas da aula”.
Segundo Moran, a TV e vídeo descobriram a fórmula de comunicar-se com a maior parte das pessoas, tanto crianças como adultas. O ritmo torna-se cada vez mais alucinatório. A coerência da narrativa não se fundamenta basicamente na causalidade, mas na contigüidade, em depositar um pedaço de imagem ou história ao lado da outra. A sua eloqüência conseguiu encontrar fórmulas que se acomodam impecavelmente à sensibilidade do homem moderno. Empregam uma linguagem concreta, plástica, de cenas curtas, com pouca informação de cada vez, com ritmo acelerado e contrastado, multiplicando os pontos de vista, os cenários, os personagens, os sons, as imagens, os ângulos, os efeitos. Os temas são pouco aprofundados, explorando os ângulos emocionais, contraditórios, súbitos. Passam a informação em pequenas doses, organizadas em formato de mosaico, ou seja, rápidas sínteses de cada assunto, e com apresentação variada, ou seja, cada tema dura pouco e é ilustrado.
A linguagem audiovisual desenvolve múltiplas atitudes perceptivas: requerer constantemente a imaginação e reinveste a afetividade com um papel de mediação primordial no mundo, enquanto que a linguagem escrita desenvolve mais o rigor, a organização, a abstração e a análise lógica.
O professor Moran cita, segundo as suas concepções, as formas de usos inadequados do vídeo na educação.
Vídeo-tapa buraco: colocar vídeo quando há um problema inesperado, como ausência do professor. Usar este expediente eventualmente pode ser útil, mas se for feito com freqüência, desvaloriza o uso do vídeo e o associa na cabeça do aluno a não ter aula.
Vídeo-enrolação: exibir um vídeo sem muita ligação com a matéria. O aluno percebe que o vídeo é usado como forma de camuflar a aula. Pode concordar na hora, mas discorda do seu mau uso.
Vídeo-deslumbramento: O professor que acaba de descobrir o uso do vídeo costuma empolgar-se e passa vídeo em todas as aulas, esquecendo outras dinâmicas mais pertinentes. O uso exagerado do vídeo diminui a sua eficácia e empobrece as aulas.
Vídeo-perfeição: Existem professores que questionam todos os vídeos possíveis porque possuem defeitos de informação ou estéticos. Os vídeos que apresentam conceitos problemáticos podem ser usados para descobri-los, junto com os alunos, e questioná-los.
Só vídeo: não é satisfatório didaticamente exibir o vídeo sem discuti-lo, sem integrá-lo com o assunto de aula, sem voltar e mostrar alguns momentos mais importantes.
Em seguida as propostas da utilização do vídeo de forma adequada, segundo o professor Moran:
Vídeo como Sensibilização: Um bom vídeo é interessantíssimo para introduzir um novo assunto, para despertar a curiosidade, a motivação para novos temas. Isso facilitará o desejo de pesquisa nos alunos para aprofundar o assunto do vídeo e da matéria.
Vídeo como Ilustração: O vídeo muitas vezes ajuda a mostrar o que se fala em aula, a compor cenários desconhecidos dos alunos. Por exemplo, um vídeo que exemplifica como eram os romanos na época de Julio César ou Nero, mesmo que não seja totalmente fiel, ajuda a situar os alunos no tempo histórico. Um vídeo traz para a sala de aula realidades distantes dos alunos, como por exemplo, a Amazônia ou a África. A vida se aproxima da escola através do vídeo.
Vídeo como Simulação: É uma ilustração mais sofisticada. O vídeo pode simular experiências de química que seriam perigosas em laboratório ou que exigiriam muito tempo e recursos. Um vídeo pode mostrar o crescimento acelerado de uma planta, de uma árvore - da semente até a maturidade em poucos segundos.
Vídeo como conteúdo de Ensino: Vídeo que mostra determinado assunto, de forma direta ou indireta. De forma direta, quando informa sobre um tema específico orientando a sua interpretação. De forma indireta, quando mostra um tema, permitindo abordagens múltiplas, interdisciplinares.
Vídeo como Produção:
- Como documentação, registro de eventos, de aulas, de estudos do meio, de experiências, de entrevistas, depoimentos. Isto facilita o trabalho do professor, dos alunos e dos futuros alunos. O professor deve poder documentar o que é mais importante para o seu trabalho, ter o seu próprio material de vídeo assim como tem os seus livros e apostilas para preparar as suas aulas. O professor estará atento para gravar o material audiovisual mais utilizado, para não depender sempre do empréstimo ou aluguel dos mesmos programas.
- Como intervenção: interferir, modificar um determinado programa, um material audiovisual, acrescentando uma nova trilha sonora ou editando o material de forma compacta ou introduzindo novas cenas com novos significados. O professor precisa perder o medo, o respeito ao vídeo assim como ele interfere num texto escrito, modificando-o, acrescentando novos dados, novas interpretações, contextos mais próximos do aluno.
- Vídeo como expressão, como nova forma de comunicação, adaptada à sensibilidade principalmente das crianças e dos jovens. As crianças adoram fazer vídeo e a escola precisa incentivar o máximo possível à produção de pesquisas em vídeo pelos alunos. A produção em vídeo tem uma dimensão moderna, lúdica. Moderna, como um meio contemporâneo, novo e que integra linguagens. Lúdica, pela miniaturização da câmera, que permite brincar com a realidade levá-la junto para qualquer lugar. Filmar é uma das experiências mais envolventes tanto para as crianças como para os adultos. Os alunos podem ser incentivados a produzir dentro de uma determinada matéria, ou dentro de um trabalho interdisciplinar. E também produzir programas informativos, feitos por eles mesmos e colocá-los em lugares visíveis dentro da escola e em horários onde muitas crianças possam assisti-los.
Vídeo como Avaliação: Dos alunos, do professor, do processo.
Vídeo Espelho: Vejo-me na tela para poder compreender-me, para descobrir meu corpo, meus gestos, meus cacoetes. Vídeo-espelho para análise do grupo e dos papéis de cada um, para acompanhar o comportamento de cada um, do ponto de vista participativo, para incentivar os mais retraídos e pedir aos que falam muito para darem mais espaço aos colegas. O vídeo-espelho é de grande utilidade para o professor se ver, examinar sua comunicação com os alunos, suas qualidades e defeitos.
Vídeo como Integração/ Suporte:
De outras mídias.
- Vídeo como suporte da televisão e do cinema. Gravar em vídeo programas importantes da televisão para utilização em aula. Alugar ou comprar filmes de longa metragem, documentários para ampliar o conhecimento de cinema, iniciar os alunos na linguagem audiovisual.
- Vídeo interagindo com outras mídias como o computador, o CD-ROM, com os videogames, com a Internet.[3]
Outras dinâmicas interessantes para o trabalho com o vídeo, envolvendo o trabalho lúdico seria:
Dramatizar circunstâncias importantes do vídeo assistido e discuti-las comparativamente. Usar a representação, o teatro como meio de expressão do que o vídeo mostrou, adaptando-o à realidade dos alunos.
Adequar o vídeo ao grupo: descrever oralmente, por escrito ou audiovisualmente situações nossas próximas às divulgas no vídeo.
Confrontar, especialmente em aulas de literatura portuguesa ou estrangeira, um vídeo fundamentado em uma obra literária com o texto original. Enfatizar os pontos fortes e fracos do livro e da adaptação audiovisual.
Para aproximar-se da TV como educador é preciso não negar nem condenar o caráter lúdico na relação com os meios. Reconhecer a recepção como espaço de produção de sentido que pode estender-se a outros espaços, incluída a escola. Mediar não significa recusar, negar, desqualificações a priori. Implica sair da posição de telespectador para provocar outras leituras, estabelecer relações analíticas, seletivas, perguntar, compreender melhor a si e ao mundo em que se vive. A mediação pedagógica não destrói a atração provocada pela televisão nem a descaracteriza. Evoca a emoção da linguagem televisiva para apreender melhor o texto televisivo, ressignificá-lo, recriá-lo, criticá-lo, fazer aprendizagem mais atrativa, mais atual.
BIBLIOGRAFIA
MORAN, José Manuel. O vídeo na sala de aula. http://www.eca.usp.br/prof/moran/vidsal.htm Acesso em: 15/12/2004.
[1] Maniqueísta: tendência de interpretar a realidade a partir de uma valoração dicotômica, ou seja, que admite apenas dois princípios criadores: um para o bem e outro para o mal, mutuamente excludentes.
[2] José Manuel Moran, Doutor em Comunicação (USP), professor da disciplina Novas Tecnologias, na Escola de Comunicações e Artes da USP. Professor de Novas Tecnologias da PUC-SP e Coordenador de Tecnologia da Faculdade Sumaré - SP. Autor de vários livros, www.eca.usp.br/prof/moran.
[3] Fonte: http://www.eca.usp.br/prof/moran/vidsal.htm
Será que o ideal não seria se tivessemos esta tecnologia em nossas aulas?
O diferencial da prática pedagógica está realmente na tecnologia ou na metodologia e nas estratégias de ensino escolhidas ao planejar as suas aulas?